Uma questão de panorama?

Orando , no dia 16 de Janeiro, o tema "O novo panorama das TIC" no âmbito da Semana Académica da Universidade Amílcar Cabral, organizada sob o lema "Pensar para melhor agir" e cujo propósito é  reflectir em torno dos principais desafios que se colocam actualmente ao ensino superior na Guiné-Bissau.

Tive a honra de, pela segunda vez consecutiva, ser convidado pela Reitoria da Universidade Amílcar Cabral para colaborar na Semana Académica organizada sob o lema “Pensar para melhor agir”. O objectivo declarado é “promover uma reflexão sobre temas pertinentes que enfrenta o ensino superior da Guiné-Bissau” (sic).
Num momento em que o país dá sinais preocupantes – hoje mais do que nunca – sobre a banalização do conhecimento e caminha vertiginosamente para o colapso do sistema educativo, incluindo a nível do ensino superior, achei a oportunidade propícia para falar de um capítulo de um dos meus próximos livros, nomeadamente sobre “O novo panorama das TIC na era da fibra óptica”.
Sendo o nosso país o único da África Ocidental que até hoje não está directamente conectado a nenhum dos cinco (5!) cabos submarinos de fibra óptica que passam ao largo da nossa costa, não possuindo consequentemente acesso internacional directo à internet por essa via, a superação desse inexplicável e inaceitável handicap cria naturalmente muita expectativa e pelos mais variados motivos.
Assim, a iminente amarração ao cabo submarino da ACE - há muito anunciada, mas por concretizar na prática – apresenta-se como uma viragem de página do ponto de vista tecnológico, inaugurando uma nova era das comunicações e de tudo quanto em torno delas gira. Uma era de muitas oportunidades, certo, mas também de ameaças e desafios.
Um desses desafios (eu diria até o maior de todos eles) é a criação e consolidação de capacidades nessa área, que é unanimemente reconhecida em todo o mundo como estratégica, porquanto catalisadora de todos os processos de desenvolvimento económico, cientifico, social, cultural, educacional, etc. São capacidades endógenas que habilitem o país a retirar o devido proveito das oportunidades que se abrem, alavanquem a sua inserção na economia do século XXI, atribuindo-lhe alguma viabilidade na era da economia baseada no conhecimento. Trata-se de um exercício em várias vertentes, que requer, a priori, criar o ambiente e as condições objectivas susceptíveis de promover um maior acesso e melhor acessibilidade ao serviço. Isso passa obviamente por um investimento adequado na educação/formação.
O que tenho constatado nos últimos tempos relativamente à educação, a todos os níveis, mas sobretudo no ensino superior, deixa-me com motivos mais que suficientes para ficar preocupado, muito preocupado. Com efeito,
- Quando estudantes de informática (em fase avançada do curso) declaram sem pudor nunca terem ouvido falar de UNIX;
- Quando universidades e institutos que outorgam diplomas de nível superior não dispõem de corpo docente compatível com o estipulado na famigerada ‘Lei do ensino superior’;
- Quando não existe preocupação palpável com a adequação do curriculum à realidade do país nem tão-pouco às necessidades específicas do mercado de trabalho;
- Quando não há os recursos nem as infra-estruturas internas minimamente exigíveis para satisfazer os requisitos mais elementares do processo de desenvolvimento do raciocínio lógico e da intuição, fundamentos da ciência da computação e de todos os outros saberes associados às tecnologias da informação e da comunicação;
-Quando a motivação central dos decisores e de alguns promotores é centrada essencialmente na viabilidade financeira da instituição;
-Quando a atitude, tanto dos órgãos de tutela como dos de regulação, se fundamenta na teoria da avestruz,
Não admira que os índices de inovação tecnológica e de governação electrónica do país sejam (continuam a ser, ano após ano) dos piores do continente!
É também nisso que é preciso “pensar para melhor agir”, tanto mais que a acompanhar a entrada na era da fibra óptica há uma factura de mais 35 milhões de dólares americanos (que já deve estar a render juros) que é preciso começar a liquidar.
Neste início de um novo ano (e mal-grado as densas nuvens escuras que pairam no céu) é minha esperança que deste animado exercício de reflexão tido com os estudantes da UAC – potenciais decisores do destino do país – surja algum incentivo adicional para, na altura certa, suficientemente “agir para melhor pensar”.

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